Era uma vez, não muito tempo atrás, em que correr na rua era coisa de “maluco”, “solitário” ou, no máximo, de atleta profissional. Quem se arriscava na Avenida Paulista ou na orla de Copacabana com um shortinho e um tênis velho fazia isso mais por instinto do que por método. Sem planilha, sem relógio, sem coach. Era na raça, no grito, e, claro, no joelho.
Mas os tempos mudaram… E muito!
As assessorias esportivas, especialmente voltadas para corrida de rua, floresceram no Brasil nas últimas duas décadas e transformaram o ato de correr em um estilo de vida organizado, tecnificado e, vamos ser sinceros, um pouquinho gourmetizado também. De clubes improvisados em parques a verdadeiras empresas com estrutura profissional, as assessorias viraram protagonistas no cenário esportivo nacional.
Começo tímido e espírito de comunidade
Nos anos 1990, algumas poucas assessorias começaram a pipocar, principalmente em grandes capitais como São Paulo e Rio de Janeiro. Eram, na essência, grupos de amigos organizados por um treinador (geralmente ex-atleta de pista) que buscava uma renda extra. A ideia era simples: oferecer treinos orientados em locais públicos como o Parque do Ibirapuera ou a Lagoa Rodrigo de Freitas. A estrutura era quase zero: um apito, uma prancheta, algumas dicas de postura e uma roda de alongamento.
Mas havia algo poderoso ali: o senso de pertencimento. Correr em grupo dava motivação, criava vínculos e, claro, fazia o corredor amador se sentir parte de algo maior. A demanda cresceu, e logo os treinos avulsos viraram pacotes mensais. Surgiram as primeiras camisetas personalizadas e, com elas, um novo tipo de corredor: o “assessorado”.
Profissionalização e o boom dos anos 2000
Com o crescimento da corrida de rua como evento – as famosas provas de 5k, 10k, meia maratona e maratona começaram a se multiplicar nas grandes cidades – as assessorias deram um salto. A virada do milênio trouxe uma nova leva de profissionais da Educação Física interessados em empreender no segmento.
A tecnologia também ajudou. Planilhas digitalizadas, medidores de frequência cardíaca e, posteriormente, os relógios com GPS abriram as portas para uma abordagem mais científica e personalizada. Os treinos deixaram de ser “corre até cansar” e passaram a seguir metodologias com base em zonas de intensidade, periodização e até análises biomecânicas.
As assessorias passaram a ocupar não só os parques, mas também espaços privados, como clubes e academias. E, como qualquer tendência bem-sucedida, o modelo se espalhou para outras cidades do país. Hoje, é possível encontrar assessorias em municípios de médio porte, atendendo desde atletas de performance até quem só quer emagrecer ou socializar.
O fator Instagram e a corrida como lifestyle
O fator Instagram e a corrida como lifestyle
Com o advento das redes sociais, principalmente o Instagram, a corrida virou vitrine. Fotos no pôr do sol, tênis coloridos, medalhas e hashtags como #partiu30k e #vidadecorredor começaram a fazer parte do dia a dia das assessorias. A identidade visual ganhou importância, assim como os eventos exclusivos para alunos – desde treinos longões com café da manhã a viagens em grupo para maratonas internacionais.
Essa estetização da corrida, claro, tem seus prós e contras. Por um lado, atrai novos adeptos, principalmente mulheres, que antes eram minoria esmagadora nas pistas. Por outro, há uma certa pasteurização da prática: tudo tem que ser compartilhável, bonito e performático. O risco é esquecer que, no fim das contas, correr é simples. É colocar um pé na frente do outro e repetir.
Desafios do presente e futuro incerto
Se por um lado as assessorias se tornaram referência de qualidade, por outro enfrentam desafios crescentes. A concorrência acirrada, a informalidade de muitos profissionais e a crise econômica fazem com que a fidelização dos alunos seja um desafio constante. Some a isso o crescimento de aplicativos de treino, que prometem planos personalizados por uma fração do preço.
Mas as boas assessorias continuam firmes, ancoradas naquilo que as fez nascer: a presença humana. Nenhum aplicativo substitui o olhar atento de um treinador, a conversa pós-treino ou o empurrão amigo no dia da preguiça.
No fim das contas, a evolução das assessorias de corrida de rua no Brasil reflete muito do nosso tempo: busca por saúde, performance, comunidade e, por que não, pertencimento. O que começou como um grupo de amigos correndo no parque virou um negócio sério, mas, com sorte, sem perder o espírito da velha rodinha de alongamento e da resenha depois do treino. Porque correr é isso: disciplina, suor e, sempre que possível, uma boa dose de alegria e, por que não, uma oportunidade de negócio!