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Neurociência e liderança – Parte 3

Colunista: Thiago Villaça

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Eu não deveria falar tão abertamente sobre este tema, mas vai ser por uma boa causa. Como especialista em comportamento e apaixonado pela dinâmica do trabalho em equipe, o objetivo do texto é usar mais de 20 anos de experiência profissional em performance esportiva e gestão de pessoas para mostrar para você, prezado leitor: (1) como que a sua postura profissional, as suas decisões ou declarações influenciam o comportamento das pessoas e equipes da academia que você lidera; (2) fazer você enxergar quais são os impactos (positivos ou negativos) que a sua gestão causa na vida dos seus colaboradores.

De verdade? Não espero que acredite imediatamente em 100% do que irei dizer, mas gostaria que levasse em consideração que o seu papel como gestor é o de transformar a vida dos indivíduos que trabalham com você. Veja bem, não disse que eles querem, muito menos que eles esperam que faça isso. Afirmo que eles precisam! Para entender isso melhor, terei que categorizar os níveis de gestão das empresas fitness, dissecando implicações, impactos e os sintomas que cada nível causa no comportamento e na vida das pessoas que trabalham com você:

  • Nível da Gestão Amadora
  • Nível da Gestão Profissional
  • Nível da Liderança de Alta Performance

Antes de nos aprofundarmos em cada um dos níveis, é importante salientar que o grau de impacto e o tamanho da mudança de comportamento que o gestor causa nas pessoas, é determinado pela capacidade que ele tem de (1) ter consciência dos limites e abrangência de suas tarefas diárias, (2) desempenhar suas funções em busca de cativar a admiração e confiança dos funcionários e (3) controlar sua rotina de atividades sem deixar de conectar e se importar com as pessoas. A soma destes três elementos dá, ao gestor, a autoridade necessária para assumir o papel de agente de transformação que os indivíduos precisam.

As responsabilidades, papéis, funções, atividades, admiração e confiança foram os assuntos desta coluna na edição 92. Está na hora de evoluir e entender como a sua gestão influencia o comportamento das pessoas, de como você é visto pelos seus colaboradores e o mais importante, quais são os impactos que causa na vida de quem trabalha para você! Preparado? Então vamos lá!

Gestão amadora

A (1) Gestão Amadora deve dar conta de mapear as características que alavancam e limitam o desenvolvimento das equipes e pessoas. Ela também deve ser capaz de estabelecer coalizões entre as equipes da academia, criar uma identidade diferenciada que destaque o serviço que é prestado na empresa das demais academias do bairro e, também, deve conhecer superficialmente a história de vida, as ambições pessoais e profissionais de cada colaborador. Nessa forma de gestão, é preciso saber organizar processos, desenhar rotinas de atendimento e estabelecer uma linguagem técnica comum entre os colaboradores para que os clientes tenham a sensação de que a academia está para oferecer qualidade, segurança e resultado para os seus usuários. No que tange a transformar a vida das pessoas e impactar o comportamentos delas, a gestão amadora precisa, minimamente, ser capaz de estabelecer uma capacitação técnica interna, seja ela um programa de estágio com apresentações de trabalhos e tarefas ou um programa de incentivo técnico profissional com apresentações periódicas e relevantes para a prestação do serviço que é oferecido dentro da academia. Todavia, estas ações de capacitação interferem de forma significativa e positiva na vida e no comportamento das pessoas. É esperado, deste nível de gestão, alguns erros de perspectiva quando falamos de trabalho em equipe e neurociência. Estes erros são evidenciados quando o gestor usa frases do tipo “no trabalho eu sou uma pessoa, tomando, um chopp no bar sou outra completamente diferente“, ou, em reuniões, o gestor dispara que “se o funcionário não está satisfeito, tem que pedir para sair“.

Em alguns casos de baixíssima inteligência emocional e extrema ansiedade, o gestor professa que o colaborador “não está aqui para fazer amigos” quando a situação exige pulso firme do funcionário para repreender outro colega de trabalho. Essas e outras falas são sintomas da insegurança e infantilidade do gestor amador. É comum que este tipo de gestor pense que a vida pessoal e profissional são elementos distintos, no entanto não existe, seja em qualquer área estudada pela neurociência, argumentos que sustentam a crença de que dividir é melhor do que unir. Na verdade, o problema do gestor amador é que ele constantemente confunde “união” com “mistura” e, para não “embolar o meio de campo”, ele prefere separar “as coisas” para que a vida profissional não atrapalhe a pessoal. Isso acontece porque o gestor acredita que “misturar” é sinônimo de “criar problema” e, por conta disso, não consegue unir o que ele tem de melhor com o que ele faz de melhor. A médio e longo prazo, este tipo de crença desgasta o relacionamento do gestor com a equipe e a relação deixa de ser de soma e passa a ser de subtração, passa a ser baseada na cobrança e deixa de ser uma contribuição, começa a expor dúvidas e deixa de inspirar confiança, passando a ser sobre gerenciar processos ao invés de liderar pessoas!

Gestão profissional

A (2) Gestão Profissional deve ser capaz de mapear, capacitar e desenvolver os pontos fortes e fracos de cada pessoa. Também deve ser apta a enxergar a equipe como um organismo hábil para encantar, valorizar, incentivar, e interferir na decisão do cliente de se matricular e/ou renovar o seu contrato com a academia. O foco da gestão profissional é sempre a experiência do cliente e, por conta disso, também deve ser eficaz para basear as decisões em dados e fatos que são estabelecidos por indicadores. A gestão profissional vai além de só organizar processos, desenhar rotinas de atendimento e estabelecer uma linguagem técnica comum. Ela insere indicadores de desempenho individuais e coletivos, estabelece padrões de resultado e usa os dados obtidos (positivos ou negativos) pelos indicadores para justificar o comportamento das pessoas. Em outras palavras, a gestão profissional consegue traduzir, em números, o comportamento dos indivíduos. No que corresponde a performance da equipe, este modelo de gestão é eficiente para se usar os indicadores de desempenho como garantia de padrão de comportamento, uma vez que os colaboradores estão, a todo momento, sendo monitorados pelos seus resultados. Tal garantia faz com que a entrega do produto e serviço da academia sejam avaliados como “superior” na ótica do cliente.

Com relação a transformar a vida das pessoas e impactar o comportamento delas, a gestão profissional precisa ser competente em desenvolver, em seus colaboradores, aspectos técnicos e comportamentais ao mesmo tempo. É esperado, deste nível de gestão, uma visão clara de futuro com uma perspectiva de formação e capacitação de talentos e estabelecimento de uma cultura organizacional robusta, sólida e inabalável. Os processos, as rotinas e a linguagem utilizada na comunicação com o cliente quase não têm diferença entre uma equipe e outra. Os erros são pouco comuns, mas quando acontecem são por causa da interferência da diretoria da empresa, como por exemplo, a tomada de decisões arbitrárias que vão contra a vontade do gestor (técnico ou operacional), negando um pedido de contratação, demissão ou alteração do quadro de funcionários. Decisões “top down” de inserção de modalidades, atividades e professores que não são aprovados pelos responsáveis da área, são erros muito comuns neste nível de gestão. No tratamento com as pessoas é possível ouvir, do gestor, algumas barbaridades do tipo “vai fazer porque eu estou mandando” ou ainda “estou tomando esta decisão porque estou sendo obrigado pela direção, mas na verdade eu não queria“. Em momentos de baixa inteligência e equilíbrio emocional, o gestor, quando expressa a sua vontade, diz que está pedindo algo (que provavelmente não pediria) porque “é o dono que está mandando“. Em casos extremos, a gestão, mesmo sendo profissional, consegue dizer “eu não te pago para pensar, te pago para fazer” para o seu colaborador. Estas expressões revelam (A) o grau de imaturidade da gestão em não assumir a responsabilidade de decisões arbitrárias e (B) a ausência de princípios, valores e crenças sustentáveis para fazer a hierarquia organizacional prosperar.

Sendo assim, a neurociência explica não só a conduta, mas também o impacto do comportamento das pessoas nos demais indivíduos do grupo e, portanto, quando o gestor coloca a autoridade de uma terceira pessoa acima da dele para justificar a decisão que foi tomada de forma arbitrária ele (C) assume, perante a equipe, que não tem função hierárquica, ou seja, é um fantoche, pois não tem capacidade para argumentar, convencer e brigar pela equipe ou pelo que acredita. Esta incompetência (D) expõe para o grupo uma ruptura e um desalinhamento nas questões estratégicas e táticas na gestão de pessoas do negócio e o impacto disso nas pessoas é  (E) o sentimento de que “não tem ninguém no comando” e, por consequência, todos podem ser reféns de uma avaliação injusta de quem, na visão da equipe, não entende nada do negócio ou, minimamente, não conhece as pessoas. Este sentimento (F) deixa o clima organizacional estressante e faz com que os colaboradores acreditem que o seu local de trabalho é um ambiente instável e hostil.  É comum que este tipo de gestor ainda sinta insegurança para se aproximar das pessoas e, por conta disso, exagere quando o assunto é a forma como exige e cobra os colaboradores.

Outra curiosidade que separa a gestão amadora da profissional, quanto ao tratamento com as pessoas, é que, na gestão profissional, a história de vida do gestor é usada, por ele, para inspirar as pessoas, na amadora, a história de vida do gestor nunca é revelada.

Liderança de alta performance

A (3) Liderança de Alta Performance tem como característica delegar atribuições gerenciais para pessoas e equipes operacionais.

Para chegar neste ponto, o gestor “só de olhar para a pessoa” já sabe quais são as qualidades e as limitações profissionais e pessoais de quem está assumindo tais responsabilidades. Por esta razão, o líder de alta performance se dedica a conhecer as aspirações e os sonhos dos indivíduos, aprofundando-se nos aspectos ligados à crença, aos princípios e aos valores de cada um.

O objetivo do líder de alta performance em delegar as atribuições gerenciais para a equipe operacional é o de abrir espaço no dia-dia para se dedicar apenas ao desenvolvimento corpo a corpo das pessoas e equipes. Neste nível de gestão, o foco do líder é o de formar novos líderes e encontrar um sucessor.

Ela deve ser efetiva estruturando e desenvolvendo os pontos fortes e fracos de cada indivíduo, incorporando, em cada responsável de equipe, o senso particular de avaliação com critérios claros, justos e bem definidos. Você não verá um líder de alta performance apelando para o “bom senso” das pessoas para querer que elas se comportem de maneira correta. Bom senso, para este nível de gestão, não existe! Sobre desenvolver os pontos fortes e fracos, esse tipo de líder deve investir tempo, recurso e energia para aprimorar as qualidades e ensinar as pessoas a administrar as próprias fraquezas. A escolha por destinar energia para potencializar habilidades e ensinar a administrar as fraquezas, se dá porque um dos segredos da alta performance é o de potencializar as qualidades e educar as pessoas a administrar o que não são tão boas. Perceba que a nossa cultura é oposta, ou seja, investimos tempo e gastamos muita energia tentando aprimorar uma característica que dificilmente será melhorada e damos pouquíssima atenção às características que nos fariam ser profissionais extraordinários.

A liderança de alta performance deve ser capaz de criar conflitos antes que eles apareçam espontaneamente na equipe. Esta afirmação se dá pelo conhecimento que o líder possui de não só gerenciar pessoas, mas também emoções. Neste nível de gestão a crença é a de que, para gerenciar bem um conflito, é muito melhor criá-lo do que adotá-lo! Assim, é possível afirmar que pessoas e equipes que trabalham em alta performance conquistaram alto grau de maturidade e são constantemente provocadas para expor o que sentem, acreditam e pensam a respeito um do outro. Ela estimula que cada um da equipe conheça a história, as ambições e as aspirações dos demais membros da equipe.

No que se refere à transformação da vida das pessoas e o impacto no comportamentos delas, a liderança de alta performance entende que existem razões emocionais e afetivas ligadas a família e a vida pessoal que influenciam o comportamento profissional e, por conta disso, estimula seus colaboradores a enfrentar seus medos e aflições mais profundas no intuito de torná-los indivíduos melhores. Os programas de capacitação técnica são gerenciados pelas equipes operacionais (com pouca ou quase nenhuma participação da gestão) e o esforço do líder é direcionado para recompensar as pessoas pela performance e produtividade coletiva. Sim, você leu certo! O líder de alta performance permite que as equipes treinem, capacitem e desenvolvam os novos colaboradores para se concentrar em avaliar, interpretar e divulgar indicadores de desempenho, engajar pessoas em um propósito mais elevado, recompensá-las por isso (nem sempre financeiramente), adotar estratégias para facilitar e melhorar a rotina, o ambiente de trabalho e o senso de pertencimento do colaborador por fazer parte de um time vencedor. Tudo isso porque o líder de alta performance entende o quão importante é ter um funcionário orgulhoso de fazer parte de algo grandioso.

Do ponto de vista do que é verbalizado por pessoas com este perfil de liderança, você sempre ouvirá em reuniões algo como “para que eu consiga defender e lutar por vocês preciso que façam o que estou pedindo“, ou ainda “se uma pessoa erra, devemos ser solidários e apontar o erro! Se você omite a sua opinião, todos perdem” e “eu acordo todos os dias por causa de vocês, levanto-me da cama por causa de vocês e venho para o trabalho por causa de vocês“.

Uma diferença curiosa que acontece entre o nível de gestão profissional e o de alta performance é que um destina esforço ao talento e o outro ao elenco. Na gestão profissional o foco é no desenvolvimento individual, na recompensa pessoal, na tarefa de cada um, no desafio das competências, habilidades e atitudes momentâneas, na diferenciação pela qualidade excepcional e na busca por algo incomum, especial e exclusivo.

Já na liderança de alta performance o foco é no desenvolvimento do espírito de equipe, na maturidade do grupo, na construção e manutenção de um propósito para o time, na busca obstinada por resultados coletivos, na criação de uma identidade global, no fortalecimento da ideia de pertencimento, no sentimento de orgulho, no posicionamento que pessoas  representam para a empresa dentro da cabeça do consumidor e no legado que será deixado para a próxima geração de contratados. A gestão de alta performance se importa com o resultado, mas se preocupa mesmo é em fazer história!

Diante de tudo que foi exposto aqui é possível que, você, leitor, (1) acredite que os desafios, as dificuldades e os problemas do dia-dia na sua empresa são uma barreira para você chegar no nível de um gestor profissional ou de um líder de alta performance. É possível, também, que você compare o seu trabalho, as tarefas e as rotinas que tem com o que foi revelado e (2) acredite que é impossível alcançar o nível de dedicação que a gestão profissional se propõe com as pessoas. Também é provável que você (3) acredite que a liderança de alta performance só é alcançada em empresas de grande porte, com estrutura milionária e acionistas dedicados exclusivamente para injetar recursos na academia. Como se não bastasse, é previsível que você (4) acredite que o nível de instrução dos profissionais de Educação Física que trabalham para você é insuficiente para trabalhar de forma madura, (5) o público que a sua academia atende não justifica o investimento em capacitação de pessoas, (6) o volume baixo de faturamento não compensa a quantidade de trabalho que terá, (7) que o retorno sobre o investimento é incerto e até (8) que o tamanho do esforço que vai fazer e a baixa garantia para alcançar um patamar superior de gestão não valem a pena. Eu concordo, mas quero que saiba que tudo isso que foi enumerado não passa de crença limitante e preciso te dizer, também, que se pensa assim, o maior problema da sua academia é você.

Pode parecer petulante o que acabei de dizer, mas não passa de uma estratégia para chamar a sua atenção e te fazer considerar a crença de que a única coisa que precisa para transformar o comportamento das pessoas e consequentemente o resultado do seu negócio é acordar todos os dias com o propósito de fazer a diferença na vida de quem trabalha com você! O imprescindível para transformar pessoas comuns em agentes que interferem na decisão do seu cliente contratar ou se manter no seu negócio é o compromisso que tem de transformar a vida de quem trabalha com você! O essencial para caminhar na direção da liderança de alta performance é se manter focado no objetivo de desenvolver pessoas! Somente isso! Faça o que precisa ser feito, custe o que custar, não porque quer, não porque ganha com isso, mas sim porque as pessoas precisam! Está disposto a ser o líder que as pessoas precisam?

Para finalizar deixo aqui a reflexão que faz parte da minha jornada profissional desde que recebi a braçadeira de capitão, quando jogava futebol profissional:

O que você acredita sobre a sua equipe, ela se torna!

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